João Maio Pinto, nasceu no Caramulo e é ilustrador, designer, docente do ensino superior e músico. É licenciado em Design de Comunicação pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto e vive e trabalha em Lisboa.
Tem publicada uma extensa obra de ilustração e design gráfico nos mais diversos media e estende também a sua atividade à música e animação, e expõe o seu trabalho com regularidade. É docente na Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha, onde leciona desde 2007.
Quando é que percebeste que conseguias desenhar?
Parece que estou a fugir à questão, mas eu acredito que todos nós desenhamos e que eu não sou mais do que os outros. Talvez eu faça sim parte de um clube restrito que acredita mais no ato de desenhar que maior parte das pessoas.
Como lidas com a questão da identidade? Sabes o que és? E o que manifestas artisticamente de que forma se liga ao que és?
Não é uma questão sobre a qual eu procure muitas certezas, pois prefiro deixar-me surpreender, a ponto de vê-lo depois vertido no meu trabalho e dessa forma, surpreender-me de novo. É a forma que escolhi para me ir mantendo aberto a experiências e pessoas que vão passando pela minha vida, enquanto me moldo ao tempo que habito.
Quando exploras novas cenas onde está a fronteira do que defines como identidade?
O que é João maio e o que, não é? Sabes?
Esta parece-me uma questão acerca da busca de um qualquer self. Posso responder a isso dizendo que procuro por mim no meu trabalho, apenas quando preciso de saber um pouco mais acerca daquilo que me faz avançar (embora muitas vezes ache mais importante a busca pelo outro). É também importante referir que não há nada em mim me faça sentir a obrigação de fazer algo que seja uma extensão de mim mesmo. Posso, contudo, dizer que o trabalho que melhor me espelha, é aquele que traduz as minhas inquietações.
Consegues identificar as tuas referências ou já lhes perdeste o rasto?
Além do Charles Burns? – Tenho muitas. Não dá para dizer aqui.
Se não fosses Maio que outro mês é que curtias ser?
Nenhum outro, mas tenho uma especial predileção por Janeiro, que é o mês do meu aniversário, ou o mês de Abril, que trás à recordação o início da democracia em Portugal.
Já foste ao museu do Automóvel do Caramulo?
Talvez o tenha mais habitado que visitado. O meu pai chegou a ser o seu gestor e ainda me recordo visitar a gráfica que o museu tinha na cave. Tenho dela uma memória olfativa que ainda hoje revisito quando vou a outra gráfica qualquer. Lembro-me de maior parte das obras de arte e automóveis expostos, como se fossem as linhas da minha mão.
E que outras coisas fazias por lá no Caramulo?
Fazia coisas de miúdo. Jogava futebol, ouvia música, andava de bicicleta, desenhava, roubava maçãs e passava muito tempo sozinho a olhar para o ar e a saltar de penedo em penedo.
Como foste parar às Belas Artes do Porto? O que é que aprendeste lá? Lembras-te?
Fui para a FBAUP, porque à época era a nota mais elevada de ingresso em Design Gráfico do país, e eu queria estar no meio dos melhores. Acabou por não ser exatamente isso o que encontrei, mas diria que foi o melhor dos tempos e o pior dos tempos. Lembro-me sobretudo de ser jovem.
O que achas que realmente ensinas aos teus alunos na ESAD das Caldas?
Achas que resulta? Qual o impacto que sentes da tua ação no possível artista ou designer que tens à tua frente?
O ato de ensinar, pode querer dizer coisas muito distintas. Eu gosto de pensar que faço diferença na vida daqueles que passam por mim, ao ajudá-los a procurarem o seu melhor e a desenvolverem a crença de que acreditar nisso é possível e/ou importante, no momento em que procuram realizar-se na área científica da sua escolha, não descurando o sinalizar os problemas e defeitos que cada um tem. Mas isto não se esgota apenas na relação do aluno com o si mesmo. Se o ajudar viver segundo uma ética que o faça agir a favor da sociedade e do ambiente que o rodeia, aí eu saberei que estou a fazer um bom trabalho.
Explica-me sucintamente, ou não, aquilo que mais te impressiona nos teus alunos.
A capacidade que têm em me surpreender. Está sempre a acontecer e há de acontecer de novo.
E o que mais te preocupa?
As gerações mais novas lidam com muita condescendência, que surge das mais variadas formas. Através da publicidade, através da política, através de todos aqueles que acham que o formato anterior de todas as coisas já era suficiente e que todas as pessoas são um dado adquirido. A falta de escuta das gerações mais novas resulta na alienação das mesmas.
Se pudesses tomar alguma decisão relativamente ao ensino artístico em Portugal, qual é a primeira coisa que te vem à cabeça?
O ensino artístico não pode obedecer a princípios que lhe são exógenos. As políticas para a educação nas áreas artísticas - e em outras não muito distantes, tal como as das ciências sociais -, devem acontecer de acordo com os imperativos científicos das mesmas. E os termos em que são avaliadas, devem acontecer também segundo esses princípios, favorecendo parâmetros qualitativos em detrimento dos quantitativos.
Tens algum sonho artístico?
Tenho e é grande. Mas não vou contá-lo.
Como relacionas a estética que existe entre a tua persona de músico e a tua a artista plástico? Existe? Coincide? Varia?
O meu trabalho é um continuum plural onde tudo é dotado do mesmo nível de desejo. Por vezes designer, por vezes ilustrador, por vezes músico ou artista plástico, ... A menos que tenhas existido no séc. XIV, o mundo relaciona-se mal com esta dispersão de categorias, mas essa é uma preocupação que cabe aos outros. Prefiro habitar um universo criativo em convulsão e sempre em aberto. No meio de todas as coisas que faço, encontro-me eu, mas gosto que aquilo que faço tenha a capacidade de se tornar múltiplo e autónomo.
Imagina que tinhas oportunidade de redesenhar os tetos da capela sistina. Aceitavas?
Não aceitava. Não aceitaria cobrir o trabalho de um colega sem a anuência ou participação dele. Há outros tetos à minha espera e aquele parece-me bem resolvido.
Tens medo de robots? Se pudesses ter um robot para fazer alguma coisa, era o quê?
Não tenho medo de robots. Tenho receio sim de quem instrumentaliza e faz da tecnologia arma. Não tenho vontade de ter um robot, até porque a substituição do fazer pela tecnologia, é uma forma de desresponsabilização e de desaprendizagem. Mas se as máquinas pudessem limpar o nosso planeta do lixo que semeámos, essa seria uma boa causa.
Quais são aqueles artistas/pessoas/pensadores que gostas mesmo e que achas essencial que toda a gente conheça?
Eu vivo muito no momento, portanto: Há dois meses li o livro “Temporada de Furacões” de Fernanda Melchor e ainda agora me estou a recompor. Gostava de recomendar este livro a toda a gente. De resto é-me mesmo difícil responder a esta questão e fazer uma lista. Entre amigos e desconhecidos, há muitos de quem eu gosto e acho essenciais de se conhecer, quer pessoalmente, quer pelo trabalho que fazem. Mas por pudor, custa-me elencá-los aqui, até porque ficaria sempre alguém em falta
O que gostavas mais que as pessoas realmente reparassem no teu trabalho?
Gostava que reparassem no bocado que lhes pertence.
Quando percebeste mesmo que ias fazer disto vida?
Pergunta-me isso daqui a uns anos.
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